quarta-feira, 24 de junho de 2015

EXU DO RIO



Põe mais um pro “Coroné”.
Estávamos no meio de uma gira de Quimbanda, entre uma consulta e outra,
quando o seu Exu do Rio virou para mim (seu cambone) e disse:
- Põe mais um conhaque aí pro “coroné”!
Observando minha expressão de curiosidade, emendou:
- “Qué sabe por que coroné”? Depois te conto.
Ao fim daquela proveitosa noite de trabalhos, seu Exu do Rio mandou que eu
me sentasse à sua frente e contou-me a seguinte história:
“Sabe, fio, eu era coronel. Desses que tem terra, possui muito dinheiro,
muito poder. E, tendo poder, eu podia ajudar muitas pessoas. E vinha muita
gente me pedir, mas eu não ajudava ninguém não.
Eu tinha muitas escravas e aprontava com todas. Tinha uma negrinha que
trabalhava na casa, era a minha preferida. Eu “tava” sempre com ela, vivia
“me deitando” com a dita cuja. Até que ela engravidou. Foi aí que eu resolvi
me casar.
Mas não pense que o coronel ia se casar com a negrinha, não! Eu mandei vir
da cidade uma moça branca, jeitosa e de boa família para ser minha esposa. E
casei.
Bom, como já disse, eu era muito rico e poderoso e tinha muitas terras,
muita riqueza mesmo. Um dia, saí com meu cavalo pelas minhas propriedades,
cavalgando pelo mato, sem rumo, só para me distrair um pouco. Eu estava
beirando um rio que eu gostava muito, o Rio Grande. Eu adorava aquele rio.
Foi quando ouvi umas vozes.
Apeei do meu cavalo e fiquei escutando aquela conversa; era a negrinha
conversando com a minha donzela. Notei que esta chorava, enquanto a escrava
sorria. Não precisei pensar muito para deduzir o que aconteceu: a negra
contou que estava “embuxada”, e que eu era o pai.
Quando eu vi num olhar tristeza, e no outro, satisfação, não tive dúvidas:
agarrei as duas e afoguei os dois olhares no rio que eu tanto amava!
Esse é o motivo do meu nome, Exu do Rio, porque eu matei minha mulher,
minha amante e meu filho afogados. Mas não é por isso que eu trabalho como
Exu hoje na Umbanda, quer dizer, não só por isso. Eu cometi muitos e muitos
erros enquanto encarnado e agora tenho que reparar isso tudo trabalhando
aqui. Essa história é só o motivo do meu nome. E,se eu fizer direito meu
trabalho, eu posso (depois de muito tempo e esforço) voltar como boiadeiro,
buscando sempre reparar o meu mal, ajudando os outros.”
Terminada essa interessante e triste comunicação, fiquei olhando por algum
tempo para seu Exu do Rio, que logo soltou aquela sua gostosa gargalhada e
disse:
- “Bão, fio, isso é passado, e agora nós temos mais é que viver o presente.
E ta na hora de eu í me embora, porque já tão mandando! Sarabumba, rapaz!”.
- Sarabumba, meu pai.

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